sábado, 2 de julho de 2011

Conto [parte 1]

Antônio disse resoluto:
- Não. Não quero seu abraço, seu beijo. Quero agora, pois a distancia dos vossos lábios, o desencontro de nossos afagos. A rua na qual proponho caminhar é estreita por demais e não caberia alguém estranho a mim. Decido pela companhia dos meus passos e tropeços nesta estrada tortuosa na qual ensejo arribar. Sei que não terei a concordância para tal decisão, mas agora já não restam mais convenções que convergem com meu próprio entendimento. O silencio se faz meu guia é ele que me faz andar por essas bandas esquecidas. Até sua companhia sorrateira me incomoda nestes dias de mar revolto.
Antes que pudesse terminar a sua fala, que mais parecia tese em tal circunstancia a porta à sua frente se fechou pela força da raiva de quem outrora chamou de amor. Pela janela ao lado ainda é possível avistar seu vulto ao longe correndo para onde só onde Deus sabe, naufragando-se em lágrimas pelo amor mal dito e agora renegado.
Maria tinha no seu pensar que amores como o dela e de Antônio não morriam nem debaixo d’água, afinal como ela mesma ouviu na ocasião do seu casamento: “O que Deus uniu o homem não separa.” Ela pensava que esse homem era advindo de um mundo externo ao dos dois. Coitada da pobre moça que não imaginava que esse homem poderia ser o próprio noivo que agora lhe dizia não.
Portas se batem quando a dor extravasa o sentimento é tanto que precisa ser ‘externalizado’, precisa fazer barulho fazer sangrar. E assim ela o fez sem nem sentir-se, provavelmente estará totalmente absorta pela dor do amor ingrato, em algum beco, rua, avenida; acredito que nem deve estar por querer saber onde é o chão o qual seus pés tocam.
E quem fica do lado de dentro de pronto percebe que muito mais uma porta a bater, existia nesse ato toda uma carga de responsabilidade.
Antônio imaginava o que seria de sua vida, agora marcada pela ausência escolhida de Maria. Ele decidira somente viver do que lhe dava prazer, sem tem que se dividir com situações, ou cousas que não julgava interessantes. Quis ter a companhia de seus livros, discos, da sua velha máquina de escrever e de seu cigarro que há um tempo havia largado pela insistência de sua ex-mulher.
Considerava-se auto-suficiente e capaz de viver consigo depois de ter tomado a grande decisão de sua vida, aquela que mudaria de forma global a sua e a história de muitas outras pessoas que seriam atingidas por esse desencontro.
Ele sempre dizia, que devia ter se casado com as letras, fossem elas habitantes dos livros, ou das belas canções que gostava de ouvir.
A sensação de liberdade boêmia das noites de infâmia e de grandes divertimentos, por um tempo lhe bastou, afinal tudo era novo, e aquela sensação de ir e vir dava a ele um ar de adolescente rebelde. Mas não demorou muito para que suas noites se tornassem enfadonhas, percebeu que apesar da sensação de mocidade ele já não gozava os seus vinte anos, e que a idade já lhe doía os ombros nos seus quase quarenta anos.
E desta forma já meio moribundo se isolou dentro das quatro paredes de sua casa grande, aproveitando para submergir neste universo das letras, dos sons e da solidão. Foi um grande momento na vida daquele homem, pois pode se encontrar na sua dor de ser um só.

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